segunda-feira, 16 de março de 2009

Cuiabania Parte 2

por Fernando Gil Paiva
Depois de ter ganhado a obra "Leito do Acaso" da escritora Lucinda Nogueira Ramos que também é professora da Universidade Federal de Mato Grosso e vive em Cuiabá há muitos anos, resolvi que parte dessa citada Cuiabania introduzida anteriormente no blog do Núcleo Parafernália deveria continuar...
Repartir o açúcar
Não troco
o movimento organizado
das formigas
por qualquer outro de maior liberade
A meta da procissão é bem clara
vai atrás do que precisa
a metros de distância

(lugar que em mim é um pouco mais longe)
Sem pensar em mais nada
acompanho com redobrada frequência
o fluxo de difícil contabilidade
lento como engarrafamento (ou funeral)

O que não se mede pela visão
deixo sem nome
mas espalho na terra e adoro
porque é o Senhor
que trabalha no meu destino
e ensina a repartir o açúcar
com quem tem fome.

domingo, 15 de março de 2009

F R A G M E N T O S

Do amor, me faço pandora.
Indianista, paixão me aflora.
Arfa meu peito sem poder respirar

Do amor, me faço uma ninfa
Onde o campo é pouco pra amar
Sofro, choro, sem poder gritar

Não sou mais existência
Astro dos loucos, sol da demência
Monstro da escuridão e rutilância
Os meus sonhos de amor serão defuntos
Reais, surreais, impossíveis de amar

A crença do amor renovará neste dia
De peito aberto, o surreal chegará
O presente que te trago é o fogo da paixão insana
Sutis e suaves, mórbidas, radiantes

por Naiza Garcia e Raphael Garcia

terça-feira, 10 de março de 2009

Cuiabania



Por Dafne Spolti (texto e foto)

Ontem minha colega de trabalho e amiga Laís Costa Marques me disse que essa casa daria uma boa foto. A intenção era pegar o corredor (que estava atrás de mim) com a plantinha no fundo. Fui lá e pedi aos velhinhos permissão para fotografar a casa. Eles me escutaram com certa dificuldade e deixaram rapidinho que eu fotografasse. Como típicos cuiabanos, sempre dispostos a ajudar.
Mas quando cheguei, a foto com o corredor não dava certo de jeito nenhum, por uma dificuldade de iluminação. Comecei, então, a fotografar a janela e timidamente os fotografei também. Quando passei a foto para o computador fiquei contentinha... A fotografia não pretendida inicialmente, provavelmente trouxe uma marca ainda maior da cuiabania, e ainda uma pequena história dos velhinhos que moram la, que tem uma imagem de santa na sala de uma casa simples e blá blá blá.......coisas que ficaram na minha cabeça...

terça-feira, 3 de março de 2009

BEIJO CARINHOSO AO CHORINHO

Roberto Boaventura da Silva Sá
Dr. em Jornalismo/USP. Prof. de Literatura da UFMT
Este artigo foi produzido quando diferentes sons de tribos diversas soavam forte durante o carnaval. No ar, ainda há restos de cinzas da festa de momo. Mas se a festa acabou, a boa música não. Ela resiste ao tempo e aos ataques que sofre, livrando seus apreciadores da produção do lixo musical aderido pelos menos exigentes. Por isso, hoje, homenageio um dos espaços culturais mais importantes e inteligentes que temos por aqui: a casa noturna "Choros e Serestas", mais conhecida - carinhosamente - como "Chorinho".
Quem lê meus artigos pode estranhar a homenagem. Em geral, prefiro a leitura política mais explícita do cotidiano. Então, por que isso? Motivos não faltam. Destaco um: a predominância do ritmo samba presente naquele espaço, o que faz lembrar a famosa casa da Tia Ciata - onde sempre tinha "samba do bom" - ou a casa de um Martinho da Vila, onde "todo mundo é bamba, todo mundo bebe, todo mundo samba". Mas samba e política andam de corpos quase sempre juntos, como se dançassem bem colados sob olhares - embora admirados - nem sempre atentos ao que realmente veem (agora, sem o circunflexo!).
Como assim? Exemplifico com "Sampa" de Caetano Veloso; embora muito conhecida, essa música esconde algo. No todo, seu texto trata de um jovem "retirante intelectual", chegando pela primeira vez em São Paulo. De cara, duas perplexidades se lhe apresentam: 1ª) a dureza/altura do concreto dos edifícios no cruzamento das avenidas Ipiranga e São João; 2ª) a novidade da poesia concreta (1956), que experimentava abandonar o verso tradicional e supervalorizar os espaços existentes no texto poético, entremeado de outros elementos não-verbais. Por isso, depois do eu-lírico (que corresponde à voz nos poemas) de "Sampa" falar "Do povo oprimido nas filas, nas vilas, favelas...", diz também que vê "...surgir teus poetas de campos e espaços.../Teus deuses da chuva".
Dos recortes, há referências não percebidas por muitos. Eis algumas: "campos" referem-se ao sobrenome dos irmãos e poetas concretistas Haroldo e Augusto de Campos; "espaços" dizem respeito aos intervalos entre figuras/linhas geométricas - presentes na poesia concreta -, assim como os espaços que há entre os arranha-céus; "deuses da chuva", numa irônica antítese, são os Demônios da Garoa, importante grupo do samba paulistano.
Pois bem. Infelizmente, pela ditadura do mau gosto - sustentada pelas aberrações do politicamente correto -, o bom samba ainda não ocupa o lugar que deveria. Penso que um dos motivos seja sua capacidade de tencionar tão bem a realidade. Acontece que essa tenção apresenta-se, muitas vezes, de forma tão figurada que dificulta a fruição imediata do texto. Agora, sem elitismo algum, lembro que boa poesia não é e nem pode ser óbvia. No mais, e antes de tudo, um bom samba é boa poesia, só que musicada.
Mas como o samba tenciona o real concreto sem perder a ternura do ritmo e a malevolência dos gingados? Isso depende da habilidade do compositor e da época. Ex: no primeiro samba gravado ("Pelo Telefone", de 1917), seu autor (Donga) diz que "O chefe da polícia/ pelo telefone/ mandou me avisar/ Que na Carioca (uma praça no Rio) tem uma roleta para se jogar...". Ora, querendo ou não, aquele samba denunciava uma prática de contravenção social, exercida por uma autoridade que deveria combatê-la.
Um outro registro que tenciona sua época - lembrado casualmente aqui - é "Vai Passar" (1984) de Chico Buarque. Em estilo de samba-enredo, repleta de figuras, a música grita pelo final da ditadura no Brasil; algo que já fora feito, magistralmente, em "Apesar de você" (1970) pelo mesmo autor. Tais sambas desafiavam os militares golpistas de 64.
Por esses e tantos outros sambas maravilhosos, os raros locais que privilegiam esse ritmo devem ser absolutamente cuidados e defendidos por parte de todos os que são capazes de compreender a importância disso na vida cultural e política brasileira. Para essa defesa - lembrando uma canção de Tim Maia, que não era sambista -, "vale tudo... ".
Agora, com a licença do Mestre Pixinguinha, um "carinhoso" beijo ao Chorinho e às pessoas sensíveis à qualidade musical. Que cada final de semana - com as fortes batidas nos surdos, tamborins, pandeiros e com o tinir das cordas de aço dos violões e cavaquinhos - seja como o pulsar forte de um coração sadio, mesmo que leviano, chorado por Paulinho da Viola. Salve o samba! Salve a força mágica dos sambistas mais velhos. Salve a alegria da juventude que por lá "passa, com graça" e, às vezes, "fazendo pirraça...". Viva o Chorinho!

segunda-feira, 2 de março de 2009

Paixão pela palavra.


por Laís Costa


" A maior riqueza do homem é sua incompletude
nesse ponto sou abastado
palavras que me aceitam como sou
eu não aceito
eu preciso ser outros
eu penso renovar o homem usando borboletas"



A poesia de Manoel só pode ser escrita assim, sem ponto final.

O ponto final limita a criação. Tende a completar.

E é justamente isso que não interessa.



O SEGREDO DE VERA DRAKE

por Fernando Gil Paiva



Quando Mike Leigh teve a chance de contar a história de Vera Drake num filme interessante e promissor, pareceu que alguns fatores deveriam apenas permanecer escondidos por um tempo, sendo assim o literal Segredo de Vera Drake.
Vera (Imelda Staunton), de uma família pobre, trabalha como faxineira enquanto o marido (Philip Davis) é mecânico. A vida da família segue suas atividades normais, sua rotina feliz, mas com muitas privações. Entretanto, nem tudo para Vera eram verdades.
E Mike Leigh fez com que essas mesmas verdades escondidas pela personagem principal e que davam o desenvolvimento à trama ficassem também desconhecidas para os próprios atores que também não sabiam qual era o segredo.
Em busca da originalidade, das surpresas e das emoções em clímax - não parava por aí a ousadia que levaria a um grande reconhecimento. Muito tempo antes, os atores já vinham se preparando, pois a própria realidade em que estavam inseridos não seria das mais acolhedoras. O diretor reuniu os atores e contou sobre o que seria a história de Vera Drake. Sem um roteiro escrito, mergulharam num árduo trabalho de improvisação dentro de um assunto que não era completamente conhecido. E treinaram, ensaiaram, treinaram...
Vera, que agia sob os lençóis da legalidade, teria por muito tempo continuado não fosse o fato de que os organismos humanos não se comportam todos da mesma maneira. E de um berço de mentiras, todos – espectadores e atores – descobrem suas atividades. Uma de suas clientes quase perde sua vida e assim, a vida de Imelda Stauton, na pele de Drake, entra em julgamento.
Tão curiosamente, um tempo depois o próprio diretor seria indicado ao Oscar na categoria de melhor roteiro original, que teve que ser escrito depois de o filme estar pronto para que a Academia pudesse julgá-lo. Também o próprio diretor e sua atriz principal seriam aclamados por um trabalho muito bem realizado.
O segredo de Vera Drake pode ser descoberto em qualquer site de cinema, mas para aqueles que ainda desconhecessem, assim como eu não sabia quando vi o filme, as emoções podem ser maximizadas na medida do envolvimento com a história, que vale a pena por si só e também pela atuação de Imelda, pela direção de Mike e pelo conjunto da obra.